quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Rabo na Boca


Antes via paisagens pela janela
só vejo janelas agora
quanto tempo se passou desde a última vez?
anos, décadas?
a decadência de se começar de novo
do zero

Isso não é novo
nem de novo
nem repentino

O começo mesmo
um grande zero
serpente engolindo o próprio rabo
traz marca do eterno

Seus olhos brilham
seu corpo serpenteia...
   Já vem você com esse papo piegas
Cala essa boca dentada!

Um grande zero, um nada
sem paisagens na janela
apenas janelas
também elas gradeadas
como esta
meio de frente
meio de quina

Olham de lá pra cá e pensam o mesmo?
Pensam o zero do eterno recomeço
pra isso
de novo?

Vejo uma ponta de romanzeira
com vontade de ar
bailante
suas folhas são pequenas
milésimas
infinitas
ligeiras
delicadas
asinhas verdes desprendendo
de si mesmas e dos galhos
que entrelaçados fazem grade
só vejo isso
e janelas quadradas

Se ainda fossem outras
redondas, maluconas e coloidais retorcidas
não seriam janelas
essas janelas
minhas janelas!

Antes via paisagens, me via nelas
um rotacionar de zero
movimento
pra frente
tolice

Tinha menos pêlos e experiência
mas tinha um “à frente”
tinha mesmo algo de seguro
o primeiro passo
tolice

Uma matrona dada 
a gulodices compartilhadas
a quem chamava de vó
apenas isso “vó”
sílaba só
nem palavra
por direito
sílaba só
e era mesmo só
 esta “vó”!

Tanta segurança
um “à frente”
justo

Hoje só janelas
e esse grande zero
multisignificado
supersignificado
inquietantemente significado

Porra!
Esse quarto-cativeiro

Uma mochilona de roupas amarrotadas, 
tecnologia e uma cabeça redonda 
cheia de idéias amarrotadas feito mochilona
uma cabeça de mochilona
enfiada em dois braços
duas pernas que sabem(?)
vagabundear

Se não fosse o zero
caminharia
mas também sem ele não seria
pelo menos é redondo
e não quadrado como janelas
essas que vejo e antes não via
quando não tinha mochila
nem musculossatura
nem coragem de caminhar
grandes distâncias

   Cara, algo se debilita no HOMEM

E em mim
o coração, meu chapa
caminha demais
acelera demais
treme demais
é músculo também
o coração treme
mesmo
vagabundo!

Na cama ele treme
e quer tudo cama
uma vida de cama
uma vida nua de cama
com paisagens nuas
corpo de mulher
montanha-quadril
queeeeeeer aprendeeeeeer a caminhaaaaar, porra!
sobre esses relevos
e se perder(?)

Cativo,
eram essas paisagens que via
quando ainda não via só janelas?

Saudades não tinha ainda
essas crias, filhotes maltratados 
deixados na rua da amargura
com roupinhas doadas, sem dignidade
sem manequim nem nada
crias de janelas e grades
essas que são minhas
dadas a meus olhos de tato
e que não eram
...antes

Uma vez dadas
her dadas
nunca  paisagem
(verde ou azul ou mole ou dura)
cores de paisagem!
nem sequer com a mochilona cheia de troço
prestes a zarpar
se não fosse o zero
se não fosse

“Antes” quer dizer aqui outrora?
É o tempo?

  Nao me venha falar desse filho-da-puta!
  Shhhhh

Prefiro e quero meu zero
metacavidade atual
sem “à frente”
sem afronta
sem ruído
e sem pressão no cerebelo
nem nos pulmões
somente folhinhas de romanzeira vistas de relance
e que nem fazem paisagem
coitada fodida
uma paisagem de meia-tigela
graciosas folhinhas verdes

E essa cama de solteiro, sem lençol, nua?
sem paisagens afundadas & fundidas
pelo cansaço de uma foda
ou de uma bebedeira
ou de um afago besta
ou da respiração cruzada
de corpos amaciados que não se tocam
mas se amam à distância
como respiro ventoso de praia
land scape

Corpo-paisagem
sem grades
nu

Nu que nada! nudez é nao amar!
[amar ou amor, tanto faz(?)]

É não vestir-se de paisagens
não ter lençóis mantas crostas
profundidades superfícies poros
sedimentar retesar inundar
vagabundear por vales peludos púbicos
e ossos-levadiços
pontiagudosaaaaahhhhhhhhhrrrrrrrrrr
(afásico/interino/replicante)

  Amor faz um carinho?

pedido de quem olha pela janela
e só ve janelas
nunca paisagens
por isso não pede
com sílaba só
não saberia

escuta bem, meu amor
e cala esses dentes quadriláteros:

rabo na boca,
infinito amor é zero

Renan Rodrigues

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